Miguel Andrade


Da carreira mundial até à Madeira


Fruto de ter uma mãe ligada ao turismo e de viver numa terra onde o sector é uma fonte tão importante de receitas.


A economia desperta o interesse de Miguel Andrade numa primeira fase. Contudo, acaba por mudar a orientação profissional. Talvez, como diz, fruto de ter uma mãe ligada ao turismo e de viver numa terra onde o sector é uma fonte tão importante de receitas.
Vai para a Escola Hoteleira do Porto em 1984, onde consegue entrar com a ajuda do “embaixador” da Madeira, João Borges.
Surge o desejo de partir para novos desafios, longe da terra que o vê nascer. Logo no primeiro ano de estágio, considera fundamental ter uma experiência clara internacional, a bem da competitividade futura.

Os primeiros trabalhos

Com o apoio de um grande hoteleiro madeirense, Francisco Pereira da Silva, consegue encontrar forma de fazer os dois estágios curriculares fora de Portugal. O primeiro é feito na Suíça, onde tem a primeira experiência profissional. Na cozinha de um hotel de cinco estrelas em Genève.
É a primeira experiência laboral e a solidão de estar longe, onde faltam os amigos e o conforto do lar.
Esses tempos não são folgados e o dinheiro ganho no estágio não é elástico.
Segue para Londres, onde procede ao estágio ao nível da recepção, reservas e outras vertentes.
Rumo a Paris
Depois, consegue fazer uma outra experiência profissional, em Paris, igualmente para um hotel de cadeia. Na “cidade luz” adiciona uma outra componente de hotelaria. Passa a ter a percepção ao nível da análise de custos de uma unidade hoteleira.
Em Paris, onde está seis meses, consegue ter uma vida mais organizada e com um vencimento um pouco melhor. Mesmo assim, não dá para vir de férias a casa.
Entretanto, o serviço militar obrigatório não o deixa prosseguir a caminhada na hotelaria.

A tropa

Vem para Portugal. Faz a tropa na Figueira da Foz e em Santa Margarida até 1989.
Depois das primeiras experiências internacionais, começa a pensar numa saída profissional.
Tem uma fixação: antes de conseguir um emprego, a opção tem de recair numa carreira. Por isso, procura uma cadeia que abra as portas a esse desejo, aliado ao facto de querer sair do país.
Hoje continua convicto que segue a melhor opção.

O Ritz

Tem a oportunidade que procura. Conta com o apoio do então director-geral do Ritz, em Lisboa, Jaques Chevason, que lhe abre as portas pretendidas.
Antes da entrevista no cinco estrelas da capital, faz alguns trabalhos em bares e discotecas para não perder o ritmo e sempre ganhar algum dinheiro. Entende que é tempo de não pedir mais ajuda aos pais nesse campo.
Chega o dia da entrevista. Miguel Andrade está nervoso. Quer convencer o director-geral que pode ser um bom potencial activo para a organização Inter-Continental.
Sente uma empatia na entrevista e entra para a Inter-Continental em 1989. Vai para a copa, para o departamento de comidas e bebidas, a sua grande paixão. Como “steward”, tem a missão de fazer a coordenação de todo o material e equipamento necessário a uma operação hoteleira neste campo. É um trabalho físico muito exigente.
Miguel Andrade diz que, além das oportunidades, é sempre bom contar com a ajuda de pessoas nas alturas certas. Apoio que tem a felicidade de encontrar ao longo da sua carreira.
É seleccionado para um programa europeu em que se preparam jovens com potencial para director-geral da Inter-Continental. Todos os anos tentam a sua sorte cerca de 60/70 jovens para duas/três vagas.

Regresso a Paris

O programa tem uma componente técnica, com oportunidade para trabalhar em diversos hotéis. Depois pagam os custos necessários para fazer um MBA, num colégio em Londres.
É uma alegria. A hora é de mudança. Tem de vender o seu primeiro carro, um Fiat Uno.
Vai de Lisboa para Paris. Tem de voltar a andar em transportes públicos.
Consegue trabalhar no Grand Hotel em Paris da Inter-Continental. Vai para o famoso Café de la Paix, na Praça da Ópera. É ali que tem o primeiro posto de supervisão. É responsável por um turno de restauração.
Vive um ano e meio em Paris. Aprende imenso.
Tem oportunidade e parte para novo desafio em Londres, em plena guerra do Golfo. A recessão internacional espreita.
O outro lado do Canal
Desenvolve uma experiência única ao nível de gestão. Aprende a arte de bem gerir com bem sabem fazer os anglo-saxões.
Vai para o Hyde Park Corner, da Inter-Continental, com 600 quartos.
Tem um considerável aumento salarial ao ponto de conseguir alugar um apartamento junto com amigos. Até aí só ganha para o aluguer de um quarto.
O facto de estar em Londres fascina-o. É a cidade única que lhe permite uma aprendizagem intensiva.
Consegue a primeira posição de assistente-chefe departamental.
Passados dois/três anos, o interesse pelo resto do Mundo continua.
Quer sair da Europa. Se possível para uma área que pouco tenha a ver com o “velho continente”.
A Inter-Continental não é muito forte na Ásia.

O 3.º mundo

Forte só na Europa, no Médio Oriente e na América.
Acaba por optar pela América Central. Deixa um dos países mais ricos para trabalhar num dos mais pobres do terceiro mundo, com uma guerra civil profunda.
Arruma as malas e parte da cosmopolita cidade de Londres para a pobre e insegura Manágua, na Nicarágua. Aí vive no hotel Inter-Continental Manágua, porque é mais confortável do que viver no exterior em constante sobressalto.
Na altura dos Somoza, o hotel pertence à família, numa perfeita mistura entre os interesses públicos com os privados.
Miguel Andrade diz que parte para o terceiro mundo completamente às cegas. Não faz ideia do que vai encontrar.
Chega de fato e gravata. Depressa aprende que não é a melhor forma de estar e jamais volta a fazê-lo naquela cidade.
Mas não desiste e cumpre o contrato. O que não acontece com um chefe de cozinha que chega ao hotel e depressa corre para o aeroporto para regressar no mesmo avião. Não resiste ao choque da cidade desfeita.

Um oásis na cidade

O hotel tem um peso significativo na vida da cidade. É o único. Tudo o que acontece na cidade, como conferências de imprensa e visitas de Estado, tem sempre o aconchego do hotel. Sempre guardado por seguranças armados até aos dentes.
Naquela unidade tem oportunidade de receber personalidades como o Dalai Lama.
O hotel faz de tudo e está plenamente integrado na vida da sociedade. Serve cerca de 1.500 refeições diárias à universidade e presta serviço de catering aos aviões das companhias Intercontinental e American Airlines.
Acaba por aprender a gerir operações que jamais tem oportunidade de fazer.
Miguel Andrade nunca tem problemas. Anda sempre de carro.

Elogio ao povo

Apesar do perigo, fica com uma boa imagem do povo nicaraguense. Um povo que diz ser muito castigado desde o clima à instabilidade política, social e económica, com ditadores e guerras civis.
Considera as pessoas muito alegres e com grande abertura para receber quem chega.
Encontra uma cidade sem cinema, que entretanto surge. O primeiro filme é acontecimento social. É o “Rei Leão”. Miguel Andrade vai ver.
Manágua é uma cidade onde todos andam armados. Nos restaurantes é pedido para deixar as armas à porta.
A distribuição da Coca-Cola é feita com homens armados. Morre-se por uma Coca-Cola.
Quanto aos clientes do hotel, a maioria é de organizações não-governamentais como a UNICEF. Turismo de lazer não há.
Miguel Andrade fica cerca de um ano e meio em Manágua. Já está cheio de ver miséria e de estar numa cidade insegura em transição para a democracia.
Cancun à vista
É hora de voltar a arrumar as malas e partir para Cancun, no México.
Vai, pela segunda vez, ser o responsável por comidas e bebidas.
Considera que é uma altura alta na sua vida profissional, depois de cumprir a “recruta” na difícil Nicarágua.
Encontra um destino de consumismo em potência, aliado à beleza do local e do povo.
Ali já pode viver fora do hotel onde trabalha cerca de dois anos.
É uma nova experiência pois encontra uma unidade tipo “resort” vocacionada para clientes de praia.
Na altura, Cancun tem cerca de 25.000 camas. Hoje já deve ter duplicado.
Considera Cancun um destino equilibrado e muito competitivo.
Durante a passagem por aquela unidade passa pela experiência de viver um furacão.
Está em Cancun cerca de dois anos e meio.
Depois vai para Guadalajara, ainda no México, para fazer o “take-over” comprado à Hyatt. Fica um ano nesta cidade onde diz que tem todo o mal de uma cidade e nada de bom. O que aproveita é a nível profissional.

Adeus, América

Quando pode, vem de férias à Madeira. Altura em que começa a sentir os efeitos de viver longe de casa. As saudades da família começam a apertar. Quer estar mais perto.
Pede para regressar à Europa. Consegue. Vai para director-adjunto do Inter-Continental de Madrid.
Algum tempo depois, já na capital espanhola, recebe um convite para novo projecto.

A Madeira
O seu amigo de infância, Luís Camacho, empresário e hoteleiro madeirense, que, coincidentemente o acompanha no seu percurso mundial, como grande viajante, a última vez em Cancun, convida-o para fazer a abertura do Madeira Regency Palace.
Está em 1997 e a unidade não passa ainda de uma obra em andamento.
Aceita o desafio, que abarca ainda as operações no Madeira Regency Club, o primeiro hotel do grupo. É 1 de Outubro de 1997.
Considera que mudar é aliciante, mas que acaba por ser desgastante na medida em que há que provar tudo de novo.
Quando regressa à casa dos pais, vem para o seu antigo quarto e não para o quarto de hóspedes que via durante as férias que consegue fazer na ilha.

29.ª casa

Pelas suas contas é a 29.ª casa desde que saiu da Madeira para estudar no Porto em 1984. Para trás ficam sete países diferentes em dois continentes, com línguas diferentes como o francês, o inglês e o espanhol e vivências igualmente nem sempre coincidentes.
Hoje está abraçado ao projecto Regency Hotels & Resorts. Considera verdadeiramente aliciante. Gosta imenso do que faz e das pessoas que estão a seu lado. Aliás, diz mesmo que, além do seu contributo, a concretização de projectos se deve à equipa que trabalha consigo e à visão dos proprietários das unidades hoteleiras.
Na cadeia Regency abre o Palace em 1998, o Lisboa Regency Chiado, em 1999, ano em que ficam com a operação do Golden Gate, e abre o Madeira Regency Cliff em 2001.
A juntar a tudo isto constituiu família. Tem dois filhos.
Mesmo assim, diz que pode um dia vir a sair para novos desafios juntamente com a família.
Formação contínua
Apesar de toda a escola prática que desenvolve nos últimos anos, procura manter-se informado do que se passa no Mundo. Assina muitas revistas estrangeiras. É um devorador de jornais.
E de quando em vez faz o que diz ser um refrescamento dos conhecimentos com passagens por cursos em reputadas universidades. Reconhece que, neste domínio, as cadeiras hoteleiras têm um especial cuidado na actualização dos seus quadros. Miguel Andrade diz que elas são os líderes da mudança.
Daí que diga que sair de uma cadeia é como cortar um cordão umbilical.
Hoje, Miguel Andrade chega ao hotel cerca das nove horas e passa a manhã a tomar o pulso da operação de todas as unidades. Isto porque entende não poder haver hoteleiros de escritório.
Utiliza a Internet e a Intranet basicamente como correio electrónico.
É uma ferramenta que utiliza muito quando está a trabalhar fora para ler os jornais.
Mas beneficia de um caso curioso: todas as semanas, o pai manda o semanário Expresso onde quer que esteja, seja em Espanha, Inglaterra ou Nicarágua. Considera um contributo único na sua carreira.
Como “hobbies” joga ténis duas vezes por semana das oito às nove da manhã, corre e joga golfe no Inverno. 

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