Edgar Aguiar


Do óleo de palma à imprensa na ilha


Edgar Aguiar. Orgulha-se de ser um empresário que se fez por si mesmo. Construiu o seu próprio percurso.

por: Paulo Camacho


Filho de uma família numerosa e humilde, Edgar Aguiar dá por si no sétimo ano (actual 11.º ano de escolaridade) com o curso de comércio da então Escola Industrial e Comercial do Funchal, actual Escola Secundária de Francisco Franco.
Está com 18 anos, no ano seguinte à revolução do 25 de Abril de 1974.
O seu grande desejo é continuar os estudos em Lisboa, para cursar Direito. Mas depara-se com a grande mágoa de não poder concretizá-lo. Os pais não têm possibilidade.
Entre os 16 e os 18 anos trabalha no Madeira Hilton Hotel, hoje Madeira Palácio. O hotel acabará por estar ligado ao longo da vida de Edgar Aguiar. Ali começa a trabalhar, faz a sua festa de casamento e se torna rotário, do qual chega a ser presidente.
Começa como aprendiz de recepção.

O Brasil

Em Junho de 1975 recebe o convite para entrar no São Paulo Hilton, no Brasil. Aceita não tanto pelo emprego e o novo desafio mas pela possibilidade de poder fazer o curso que tanto deseja.
E para conseguir concretizar o sonho do Direito, tem de ter um emprego para suportar os custos.
Vai para o Brasil. Para a grande metrópole que é São Paulo. Trabalha durante o dia e estuda entre as 19 e as 23.30 horas na USP — Universidade de São Paulo.
No hotel trabalha no “front-office”. Chega a ser “front-office manager”, que inclui as áreas de recepção, portaria e caixa. Depois, é subdirector do São Paulo Hilton, uma unidade de cinco estrelas.

Belém do Pará

Entretanto, termina a faculdade. É convidado a integrar a rede Novotel, onde trabalha durante três anos. O novo desafio implica a saída de São Paulo. Vai para Belém do Pará, a norte.
Vai para a direcção. É gerente, o equivalente ao tradicional director, do Novotel Belém.
Quando termina o estágio de advocacia, deixa a hotelaria.
Decide abrir um cartório de advocacia empresarial, trabalhista e de fiscalidade. Trabalha intensamente durante cinco anos no início da década de 80.
Cedo tem muitos clientes da indústria dos óleos vegetais. Apanha uma altura de decadência na produção de óleo de palma. Cerca de seis meses depois de aceitar tratar dos problemas internos de uma empresa, depara-se com a morte de dois dos três sócios. São pessoas já com uma certa idade.
A envolvência de Edgar Aguiar com a empresa ultrapassa a de um mero advogado. Há uma ligação cada vez mais intensa com a incorporação dos problemas da empresa e com a tentativa de tentar resolvê-los, para além da actividade para a qual é contratado.
Quando dá por si, é gerente da empresa. Uma empresa que já não tem dinheiro para pagar os seus honorários.

Empresário

A um dado momento, dá-se a possibilidade de comprar as duas terças partes dos sócios falecidos. Reconhece que não teve tarefa facilitada para conseguir o dinheiro.
Apesar das dificuldades, tem um bom ano na sua empresa e consegue pagar a sua parte na sociedade.
Outros anos sucessivos apresentam bons resultados na empresa.
Ao fim de três anos, fica dono da unidade, depois de chegar a acordo com o sócio.
Entretanto, durante o tempo que domina os destinos da empresa, inova nos processos produtivos. Tira maior proveito do óleo e, mediante processos refinados de filtragem, consegue que seja utilizado na cozinha. Diz mesmo que esta aposta faz a empresa evoluir fortemente entre as mais de 60 indústrias congéneres que existem em Belém do Pará.
Até então, a fábrica e a maioria da concorrência fazem apenas a extracção bruta do óleo, que, depois, é vendido para as indústrias em São Paulo. Estas, por sua vez, refinam e fazem um valor acrescentado. É o que diz ser a teoria dos grandes centros a dominar os mais pequenos.
Edgar Aguiar adquire uma unidade de refinação do óleo que produz. Passa a embalar garrafas de óleo de cozinha. É uma unidade considerada tão valiosa como a de extracção, à qual fica contígua.
Começa a tirar partido do circuito integrado de produção.
A dado momento, tem à sua responsabilidade a colheita da amêndoa de palma, o que lhe permite chegar à produção das duas mil toneladas de óleo vegetal por mês. Tem a industrialização da amêndoa com o óleo bruto e refinado.
A dado momento, a crise chega a uma das fábricas de plásticos em Belém do Pará. Edgar Aguiar fica sem garrafa para colocar a produção. Vê-se obrigado a dar novo passo. Compra duas máquinas de fazer garrafas e garrafões, desde o 1/2 litro até aos 30 litros.
Os novos equipamentos são colocados num armazém contíguo. É criada uma fábrica de envasamento e produção de embalagem.
Ao olhar para trás, reconhece que nenhum daqueles passos é planeado. Vão acontecendo à mercê das circunstâncias.
Edgar Aguiar produz óleos com as marcas Palma Belém, Girassol e outras.
A sua produção é maioritariamente comercializada no Estado do Pará, com mais de seis milhões de habitantes. A cidade de Belém do Pará tem cerca de dois milhões.

Mais de 220 empregos

A unidade industrial de Edgar Aguiar chega a ter 220/240 empregados, até regressar à Madeira. Um empreendimento erguido no espaço de sete/oito anos.
A juntar a todo o processo produtivo, além do óleo, a amêndoa produz o óleo e uma matéria orgânica que se converte em farelo. Um farelo que serve como componente para rações animais. Não representa mais de cinco por cento da facturação da empresa. Dizem que há muita abundância nos pastos e ninguém compra rações.
De um momento para o outro, depara-se com cerca de três mil toneladas por mês de sobras a encher os armazéns.
Mais uma vez tem de encontrar solução. Cria uma nova unidade industrial contígua às demais para a própria produção das rações para animais. Consegue, assim, controlar o processo de comercialização e o consequente escoamento dos “stocks”.
Contrata um engenheiro e é engendrada a mistura acertada. Passa a ter mais um produto para venda, vendido em sacos de 25 quilos.
Edgar Aguiar compra a matéria-prima de diversos produtores locais. Chega a ter uma fazenda com 1.800 hectares. Mas esse não é o seu negócio. A sua filosofia é a industrial. Defende que o empresário deve apostar naquilo em que se dá bem. Assim, ao fim de dois anos, vende o terreno.
No Brasil chega a participar como sócio minoritário numa empresa gráfica. Uma actividade que só lhe dá dores de cabeça. Reconhece não ter sido um bom negócio para si. Contudo, permite-lhe ter um conhecimento profundo do sector.
Chegado a este ponto, há muito que o empresário deixa parada a actividade de advocacia que o leva ao mundo empresarial. Ao fim de três anos com as rédeas da empresa está tão absorvido que não tem tempo para exercer a profissão que sempre quis.
Edgar Aguiar reconhece que a sua vida é um comboio. Está numa estação sempre pronto para aceitar os desafios dos destinos.

Investimento na ilha

Enquanto está no Brasil, só ao fim de oito anos é que vem de férias à Madeira. Diz que, se não é a parte afectiva que o liga à ilha, hoje, com certeza não estaria em Portugal.
Edgar Aguiar é casado com uma madeirense, que conhece dos tempos da escola, embora andem em instituições diferentes.
Volta à Madeira em 1984. Casa em 1985 e regressa com a mulher para o Brasil para continuar a actividade industrial. Lá tem a primeira filha.
Fica no “país irmão” até 1991, altura em que inaugura na Madeira a Amaplast, uma empresa de plásticos inserida na Zona Franca Industrial do Caniçal, que integra o Centro Internacional de Negócios da Madeira. É uma fábrica de plásticos flexíveis. Na prática, Edgar Aguiar transfere o saber fazer adquirido na unidade do Brasil para a Madeira. Na nova unidade instala novos e modernos equipamentos.
A Amaplast torna-se a primeira unidade industrial com construção própria no Caniçal.
O Brasil começa a ficar cada vez mais distante. Diz que, com certeza, se tem lá ficado, duplicaria o património. Mas não lamenta. É uma questão de opção, salienta, sem pestanejar.
No fundo reconhece que também procurava um lugar mais calmo e seguro para viver.
Aos poucos começa a vender as participações no Brasil. A última acontece em 2000. Ao invés, vai investindo na Madeira.
Pouco apreciador de decisões a quente, prefere antes a solução evolutiva. Por isso, a sua entrada na Madeira no mundo empresarial ocorre de forma faseada.
Em 1995 faz dois projectos de investimento. Um é a Brasilite, novamente na área do plástico, mas descartável, como copos e talheres.
Por outro lado, cria uma gráfica: O Liberal.
Edgar Aguiar justifica o investimento nesta área ao detectar uma grande carência na existência de unidade gráfica actualizada.
Recorda que, nessa altura, um folheto demora 60 dias para ser feito na Madeira. Diz que em 1995 é mais barato e rápido ir a Lisboa ou Londres fazê-lo.
Assim, deixa claro que a aposta n’O Liberal surge puramente por razões de mercado.
Recorda que a sua aposta recebe muitos adjectivos, mas justifica com o tempo a justeza da sua aposta. Adianta que, desde o projecto inicial, são feitas três reformulações ao projecto, que se traduz no investimento tão forte como a primeira vez por três ocasiões. A última acontece com a rotativa para a impressão de jornais.

A imprensa

E, neste percurso, mais uma vez, é o destino que molda a sua linha de rumo.
Um cliente encomenda a impressão de uma revista com cinco mil exemplares. Não as paga. Mas já quer fazer um segundo número do que diz chamar-se “Feira Livre”.
Com o contratempo, desperta para um projecto jornalístico. Um jornalista e um fotógrafo da revista falam com Edgar Aguiar à procura de emprego. O empresário diz não ter lugar. Em resposta sensibilizam Edgar Aguiar para fazer ele próprio uma revista, uma vez que já tem a parte produtiva.
Não fecha a porta. Sem medo de novos desafios, avança para o segundo número, que está para publicar para minorar parte dos prejuízos da primeira. Para tal, necessita de falar com a proprietária do título. Tudo fica acertado com os jornalistas. Mas não há acordo em relação ao título. Por isso, há que pensar em mudar de nome.
Edgar Aguiar trata de todo o processo e registo. A dada altura já não pode voltar atrás.
Tenta alguns nomes como “Maré Alta”. Não são aceites. Até que um acerta: “Saber”. A revista sai. Os primeiros meses são desanimadores. O ganho está no saber fazer produtos desta natureza com os seus colaboradores.
A revista vai evoluindo. Até hoje.
Com o projecto consolidado, há três anos surge a ideia do semanário. Diz que não é uma ideia sua. Recorda que um dia três jornalistas, dois ligados ao Diário de Notícias e um que já havia saído daquele jornal, o procuram a desafiar para um novo projecto jornalístico.
Um dos dois jornalistas é Luís Calisto. Um profissional que diz ter convicções e uma importância fundamental na decisão de investir num semanário. Admite que, de início, esteve em cima da mesa a possibilidade de ser publicado uma vez por semana ou mesmo diário. Seis meses depois sai o “Tribuna da Madeira”, um semanário publicado à sexta-feira.
Na mesma gráfica onde é impresso o semanário, também é feita parte do jornal do continente “A Bola”, que escolhe a gráfica do PIZO — Parque Industrial da Zona Oeste, para fazer diariamente na Madeira os seus jornais.
De realçar que Edgar Aguiar tem ainda uma unidade de distribuição do Tribuna da Madeira, do jornal desportivo e da revista Saber.
Neste momento, Edgar Aguiar ainda tem algumas áreas no Brasil, em Belém do Pará, que tem arrendado a unidades industriais.
Diz que, depois de tomar a decisão de ficar na Madeira, jamais pôde comandar empresas à distância, sobretudo num país que exige ter o dono à frente. Senão não funciona.

“O dr. português”

Neste âmbito, recorda um episódio que acontece quando já está abalançado para a Madeira. Umas boas dezenas de residentes nas imediações da gigantesca zona industrial onde tem as suas unidades fabris batem à porta. Apesar dos receios iniciais, acede a receber uma meia dúzia em representação do grupo, para saber o querem.
Lamentam-se que não conseguem escoar a sua produção manufacturada. Neste sentido, pedem que o empresário lhes ajude comprando as peças, podendo vendê-las depois em Portugal. Compreensível, deixa uma mensagem animadora. Diz que podem vir trazendo algumas peças.
Entretanto, regressa à Madeira. Deixa indicações ao gerente para ir comprando peças e guardando no armazém.
Um mês depois, volta ao Brasil. E qual não é o seu espanto: tem o armazém, com seis mil metros quadrados, a abarrotar de artigos de cerâmica feitos pelos autóctones. Ainda hoje tem algumas dessas peças na Madeira, para onde as trouxe em contentores.
Com esse gesto, o empresário consegue um facto relevante. Das mais de 90 do parque, a sua é a única que não é assaltada. Dizem que “ninguém toca no doutor português”.

Rotário

Actualmente trabalham no conjunto das suas empresas cerca de 120 pessoas. Diz que é um dos maiores empregadores industriais da Madeira.
A juntar à sua actividade profissional, Edgar Aguiar é associado do Rotary Clube do Funchal, do qual foi presidente entre 2001 e 2002.
Hoje em dia, o maior hobbie de Edgar Aguiar é a família. Há sete anos que não joga o “seu” ténis, principalmente depois de nascerem os seus últimos dois filhos, já na Madeira, e das várias unidades industriais. Não obstante, quer voltar a praticar o seu desporto favorito.
No domínio das leituras gosta de ler biografias e livros de aventura.
Também lê jornais e revistas.
A nível do trabalho médio diário é o primeiro, ou dos primeiros, a chegar à empresa, pelas 9 horas, e o último a sair, pelas 21.30 horas/22 horas. Faz um intervalo para o almoço e é um adepto confesso de uma sesta, de 20 minutos. É um hábito que traz da área quente de Belém do Pará, onde o calor é muito intenso a meio do dia.
Edgar Aguiar tem um bom relacionamento com as novas tecnologias na óptica do utilizador. Diz que ele próprio faz algumas cartas. As de maior número são feitas pela secretária. 

Comentários

Mensagens populares